domingo, 3 de janeiro de 2016

O piano, o rio e o mês de janeiro

O piano cria uma melodia bonita. Não costumo, geralmente, dizer coisas deste cariz acerca de melodias, mas hoje redescobri a beleza do piano; senti-me ansioso. Ansioso mas certo de estar capaz de ouvir piano durante horas - como se pudesse martirizar-me com tal coisa. O piano leva-me a sítios onde eu nunca estive - onde, porém, desejo estar - ainda que me pareçam todos extremamente familiares. Quentinhos, mas tristes, como só eu sei que existem.
Quero levar a carga dramática do piano comigo - isso e o quanto me custa escrever neste momento. Parece-me a mim que já não sei fazê-lo. Pelo menos, não com a fluência de outrora. Não que não saiba construir frases - longe disso -, trata-se de imaginar coisas, idealizá-las e pintá-las em fumo na mente. Por aí me fico. No papel, ganham formas horrendas e desconexas, como se não houvesse ligação do meu interior para o que me rodeia, o que seria muito triste. Não quero viver noutro sítio que não o mundo real, mesmo sabendo que tenho a possibilidade de escapulir-me para longe de adversidades várias. Os meus sonhos estão apenas altos quanto baste, altos o suficiente para que não os consiga agarrar.
Sinto-me, por isto, triste. Não desesperado, nunca. Apenas triste e cansado. Daí querer carregar o peso de me custar escrever - nunca esquecendo a gratidão que devo às forças motrizes do universo por ter em mim dom como este, que tantas emoções me permite e me provoca.
Estou a tremer, de momento. A tremer a sério. Quis escrever por culpa do piano. Estou a tremer mas não tenho frio, apesar da minha meia manga nesta noite de janeiro. O cruel e gélido mês de janeiro. Estou ofegante como se tivesse estado a correr, embora esteja sentado. Escrevi pelo piano, mas centrei-me em mim, quando, na verdade, queria que isto chegasse a outra pessoa - e que essa pessoa me agarre depois de me atirar ao rio, que ainda não parou de correr nem por um segundo.